22/08/2017 11:40

Toda a comunidade está convidada a participar da Missa em Ação de Graças pelos 100 anos de vida de Padre Armando, no dia 22 de agosto, às 19h, na Paróquia Santa Teresinha

 

A entrevista havia sido marcada com antecedência. No dia combinado, chequei o gravador, papel e caneta e a máquina fotográfica. Estava tudo certo. No caminho para a entrevista recebo a ligação avisando que o entrevistado não estava se sentindo muito bem e por isso talvez a conversa não pudesse acontecer. Compreendi no primeiro momento, afinal, a entrevista seria com Padre Armando Brédice, que no próximo dia 22 de agosto completa 100 anos de vida.

Continuei o caminho até a paróquia Santa Teresinha, localizada do Cruzeiro Novo. Lá chegando fui recebida pelo assessor de comunicação, Henrique Cavalheiro. Se desculpando, ele me explicou que naquele dia Padre Armando estava um pouco indisposto e cansado.

Apesar da decepção pela mudança de planos, pensei comigo, eu, nos meus trinta e poucos anos acordo indisposta inúmeras vezes, quem dirá um senhor de 99 anos. Mas se estava lá, aproveitei a viagem. Conversei com o Henrique que convive quase que diariamente com Padre Armando. No momento os dois estão trabalhando juntos na organização da Missa em Ação de Graças pelos 100 anos. “Padre Armando acompanha tudo e esta super empolgado. Quer saber como estão as coisas da Missa e do jantar. Ele também está treinando as frases para o dia especial, porque ele mesmo quer presidir a celebração”, conta Henrique.

Inicio a conversa perguntando ao Henrique se Padre Armando ainda tem irmãos vivos. Para a minha surpresa ele responde que ele tem um irmão vivo com 106 anos e uma irmã mais nova. Têm também muitos sobrinhos, todos vivem na Itália.

É na Itália que está sua origem. Nascido em um vilarejo no interior da Itália em 22 de agosto de 1917, Padre Armando vivia com os pais e mais 9 irmãos em uma casa simples e modesta. Sua infância foi muito pobre e difícil, ainda mais depois que o pai deixou sua mãe e os 10 filhos e se mudou para a Argentina. Nunca mais voltou. Sua mãe, Angiolina, teve de criar a família sozinha e com muita dificuldade.

“Padre Armando conta que sua mãe levava todos os filhos para moer milho, trabalho comum naquela época. Certos dias, o único alimento que tinham para comer eram as espigas que caiam no chão”, contou Henrique.

II Guerra Mundial e Vida Religiosa

Com apenas 18 anos de idade foi convocado para lutar na II Guerra Mundial. Por sorte, ou designo de Deus, havia feito um curso de alemão e inglês por meio da escola que frequentava. Por isso sua atuação na Guerra foi a de tradutor. Nos quase seis anos que durou a II Guerra, Padre Armando não pegou em armas, mas ia para os campos de batalha. Perdeu muitos amigos próximos, presenciou cidades devastadas e famílias destruídas.

Foi por presenciar toda a destruição e horror da guerra que brotou em seu coração a vontade de servir a Deus por meio do sacerdócio.

Naquela época muitos jovens que perderam tudo, família, casa, amigos, viam na vida religiosa uma última saída para voltarem a viver. Por isso muitas congregações tiveram de fechar suas portas para novos processos de discernimento vocacional.

Padre Armando recém ordenado

Depois de muito procurar algum lugar que o aceitasse, Padre Armando já pensava em desistir, quando sentado em uma Igreja, que pertencia a Congregação dos Servos da Caridade, um Padre lhe perguntou por que estava tão triste. “Quero ser Padre, mas ninguém quer me aceitar”, respondeu Padre Armando. Então o sacerdote perguntou se ele sabia mexer em máquina de escrever e a resposta foi de imediato: “sim”. E ele começou a trabalhar naquela paróquia como secretário e somente em 1947 deu início a sua vida religiosa.

Padre Armando foi ordenado em 19 de dezembro de 1953. O orgulho de sua mãe foi tamanho que mesmo com a situação financeira ainda difícil, fez questão de, com a ajuda de sua patroa na época, comprar um cálice para o filho. Grande e cheio de detalhes em prata e dourado, o cálice é usado até hoje pelo Padre Armando.

Missão no Brasil amor por Brasília

Um ano depois de sua ordenação, padre Armando é mandado em missão para o continente Americano, em 1954. Trabalhou no Paraguai por cinco anos, passou pelo Rio Grande do Sul, São Paulo e em 1983 chegou a Brasília, após uma curta missão no Mato Grosso, voltou a capital onde está até hoje.

“Padre Armando ama Brasília. Ele pediu aos superiores para ficar aqui até o fim de sua missão. Ele diz que aqui foi acolhido e se sentiu bem e amado pelas pessoas. Ele também gosta do clima, ele odeia frio”, conta Henrique sorrindo.

Mas na época em que chegou por aqui, o sacerdote se incomodou bastante com a pobreza que via andando pela cidade. Muitas famílias não tinham para onde ir e dormiam nas Rodoviárias. As mães não podiam trabalhar por conta das crianças. Era um caos.

Padre Armando não mediu esforços para fazer algo por aquelas pessoas. Conversou com a comunidade, procurou as autoridades até conseguir fundos para, no terreno da Paróquia, construir uma creche. Na época vinham mães de todas as regiões de Brasília deixar suas crianças. A creche era 100% filantrópica e ajudou muitas famílias a melhorarem de vida.

Talvez por esse olhar pelos mais pobres Padre Armando tenha sido tão querido pelas autoridades locais e pela comunidade. Com sua simpatia e gentileza chegava até as pessoas com humildade e por isso conseguia muita ajuda. Sua determinação despertava admiração por onde passava.

Segundo Padre Antônio Viana, que é superior da Casa Religiosa dos Servos da Caridade em Brasília, Padre Aramando sempre foi muito conhecido por sua determinação e força para realizar as coisas. “Padre Armando sempre teve muita facilidade de contatos com o governo e a sociedade. Ele tinha uma grande facilidade de conquistar, de agregar essas pessoas para ajudar quem mais precisava. Ele tem um espírito de decisão muito grande. Ele não sabe se entregar fácil ele não desiste fácil. Não mede esforço e é sempre muito firme nos seus objetivos. Ele é uma força! É um exemplo muito bom de persistência, já que hoje a juventude desiste com tanta facilidade, ele se torna um grande exemplo”, partilha.

Henrique me mostra as fotos da última vez em que o Padre foi visitar a família. Fotos de seus sobrinhos e irmãos reunidos à mesa, do Padre Armando Celebrando a Santa Missa, dele visitando lugares turísticos. O que chama atenção é que em todas as fotos Padre Armando está com o sorriso largo, parece bem disposto, feliz. Contagia quem vê.

Na sala em que estávamos havia muitos quadros com fotos nas paredes. Tinha o padre Armando em seu encontro com São João Paulo II, com autoridades políticas locais, com bispos e com a comunidade em casamentos e batizados.

Pergunto para o Henrique se ele é sempre assim, como nas fotos, alegre, sorridente, simpático. Ele me responde que sim, que ele é muito animado e que gosta muito de brincar e contar histórias.

Termino minha conversa com um profundo desejo de conhecer e poder conversar pessoalmente com uma pessoa com tamanha experiência de vida como o Padre Armando. Saí com a sensação de que não faltarão oportunidades para esse bate papo. Afinal, com essa vitalidade aos 100 anos de idade, só posso crer que Padre Armando ainda estará conosco por muitos e muitos anos ainda.

 

 

 

 

Por Kamila Aleixo

Fotos: Arquivo pessoal